sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

CADÊNCIA



Das estrelas cadentes
Subentende-se
Estrela que cai
E delas os simples dizem:
"Mudou de lugar"
E eu faço o pedido:

Quero a felicidade.
Não a que cai,
Mas a que muda de lugar.

1999 E O VENTO LESTE



Minhas paixões estão
Por aí, no vento.
Será que só eu
Tenho ouvidos atentos?

Minhas paixões uivam
Farpas no relento.
Será que são meus
Estes ouvidos sangrentos?

DIDÁTICA



O poema é um brilho de sol
Refletido nos olhos fechados
E o poeta é menino,
De olhos fechados,
Tentando tocar essa luz.

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

AS CIGARRAS



As cigarras zumbem,
Zumbem, zumbem
No céu azul
E uma puxa a outra
E outra e outra...
De repente é uma ciranda
Zumbindo a amplidão.

Pudera tanto zumbido
Estilhaçar esta redoma,
Não fosse infinita a prisão,
Não fosse tão pequeno o coração,
Não restasse ainda infinito
O azul no caco de vidro.

Não foi à toa
Que a chamaram cigarra,
Feminino de cigarro:
Se o cigarro vai bordando
De fumaça a solidão,
A cigarra vai bordando
De zumbido o verão.

NOVEMBRO



O céu limpo
E o horizonte amarelo
Inebriado nas sobras
Do sol poente.
Vênus ergue-se
Austera,
A nordeste
E o frio na alma
Que se sente
Na primavera
Ah, quem dera
Fosse eterno,
Mas é só
Resto de inverno.

JOGO DE DADOS



Meu amor que me perdoe
Mas não me dou o direito
De ser feliz:
Tenho todos os motivos
Mais um
Para estar triste.

Se o amor ficar
Eu sei
É seu lugar;
Se o amor passar
Eu sei
É sua lei.

Não tenho nada
E ganho tudo
E o tudo em mim
Implora mudo,
Uma migalha que seja
De fim.

Ah, sorte viciada
Em mim cravada,
Diz ao meu amor
O que farei
Sendo pra todo o sempre
De ti o rei.

Meu amor que me perdoe
Mas não me dou o direito
De ser feliz:
Tenho todos os motivos
Mais um
Para estar triste.

sábado, 16 de dezembro de 2017

NOTURNO DA ETIMOLOGIA



Os vagalumes
São almas penadas
Que vagam lumiando
A noite.

As almas penadas
São almas empenecidas,
Compadecidas
Do escuro mundo
Da nossa tristeza.

REVIVIDA





















Essas tardes de sábado
Ensolaradas
Após a chuva
Na primavera
Não me enganam:
São moças vaidosas
De banho tomado
Se perfumando
Pra namorar.
Essas tardes de sábado
Ensolaradas
Não vêm a hora
Da noite chegar.

CAOS PRIMORDIAL



O cheiro tosco do teu sexo
Dribla todas as artimanhas
Das indústrias dos cosméticos
E cheira somente a sexo;
Cheiro que embriaga o corpo
E deixa lúcida a alma
Lúdica calma
Que me draga
Em lambuzado sossego -
Areia movediça -:
As mulheres devoram dos homens
Somente o necessário
Pra cuspir à vida.

FESTA NO CÉU









A rã voa no azul do céu
E o espelho d'água
Se contorce em gargalhadas
Dessa insana patacoada.

sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

MONTE PALOMAR



Aldebarã e Betelgeuse
São duas mulheres
Que amo.

Aldebarã e Betelgeuse
São dois olhos que amo
Numa só mulher.

Aldebarã e Betelgeuse
São esse amor
De tanto tranbordado

Pois de ontem já sabia
Que amanhã em ti veria
O meu hoje consumado.

NOVA CANÇÃO DE AMOR



O lobo solitário
Entoando odes enlouquecidas
À lua
Morreu em mim.

E o meu amor
Só consegue ser assim:

A gravidez desse silêncio
Noturno
Ressonando em minha alma.

NOTÍCIA DE JORNAL



As implicações de cunho moral,
Político, ideológico,
Social ou econômico
Ficaram sepultadas  no momento
E o fato se cristaliza
Na memória passageira:
Estudante é morto
Ao se recusar a entregar
O violão.
O corpo tomba inerte
Ao lado da via férrea.
Dedos percorrem notas
Encardidas de dinheiro,
Estendidas na escala musical.

A diferença entre um tom
Maior e um menor
É que a terça abemolada
Atribui ao acorde menor
Um som de tristeza

E o mundo soa o presseguir
Em tom menor
Mas, amanhã...
O fato se cristaliza
Na memória passageira.

DA SABEDORIA II



A felicidade, na certa,
A gente escreve
Em letras tortas
Ou certas
E o Diabo me corrija
Se eu estiver errado
Mas não se olha os dentes
De um cavalo dado
E a felicidade, na certa,
É grito de gol
E bola na trave.

sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

CÂNTICO ROMÂNTICO



Quem inventou o dinheiro
Foi um grande embusteiro.

Quem queima dinheiro é louco.
O louco toca fogo no dinheiro
E dá risada.
Já pensou se todo mundo fosse louco:

A vida seria mais engraçada
Ou só mais iluminada?

REINCIDÊNCIA



Menina, você não sabe mas,
Vou ser, de novo, poeta,
Pois a inocente renitência
Pode ser penitência
Ou, talvez, só o remédio
A um mal que já está feito.

O ÚLTIMO POEMA



Já que essa tristeza não tem fim
Quero vivê-la assim:
Você e eu até o fim.

RENDEZ-VOUS



O ar inda traz o cheiro doce -
O meu velho nariz
E sua mania de boca -,
Mas esta incógnita flor,
Vez ou outra,
Brota em seus canteiros etéreos.
Será só pra me ver passar?

O tempo veste um seu casaco antigo
Mas, ah, sai de mim
Esta quase vontade de chorar.
Não quero que entendam
Os anseios e as frustrações em meus sonhos.
Quero pura e simplesmente que me amem
Na pureza e simplicidade que é amar.