sexta-feira, 30 de junho de 2017
TEIMOSIA
O alvo espera
Sabendo sua sina:
Um sibilo no ar
E os instantes eternos
Desabrochando
Feito flores.
Beija-me assustada
Como criança que,
De repente,
Se descobrisse
Pisando nuvens.
Beija-me pretendendo
Carinho de relva e orvalho,
Com cuidado,
Para não despertar
O sonho de antigos quadros
Preto e branco:
Nossa luz
Prometendo
Toda nossa história
Já sabida -
Outras camas
E outros jeitos
São pouco,
Nós somos perfeitos.
sexta-feira, 23 de junho de 2017
O EVANGELHO SEGUNDO A VERDADE (Versículo Dois)
Prometeu trouxe o fogo aos homens
E, de castigo,
Teve uma eterna dor de fígado
Esquecida dos homens
Que, no frio,
Esquentavam-se ao redor
De fogueiras.
- Meu filho, não leia muito! Os livros vão te deixar atrapalhado das ideias - disse o lenhador ao rapazola, enchendo os pulmões de ar para apagar a lamparina que iluminava, toscamente, o rude cômodo da choupana.
MR. TAMBOURINE MAN
Atire moedas no meu chapéu
E lhe dou, de mentirinha,
Um pedaço do meu céu.
Irá chover?!
Pra bom leitor, pingo é i
E jota, cabo de guarda-chuva.
LEVIANDADE
Por amar demais
Tudo o que a gente faz;
Por sentir amor
Até morrer de dor;
Por ver que chorava
Tudo o quanto amava
E ainda querer amor
Só mais um pouquinho,
De tanto amor
Ficou sozinho.
sexta-feira, 16 de junho de 2017
CISCO NO OLHO DA TARDE
Delírio de fachada;
Lírio sopra no vento
Colírio desatento;
Lírio desfolhado
Martírio sossegado -
A tarde já promete
Noite ao quintal
E as sombras caminham
Nas compridas pernas-de-pau,
Num jeito tão bandeira
E a gente até suspeita
Que elas gostam de espiar
O lugar onde o sol deita.
O VELHO NO PASSEIO PÚBLICO
Uma reviravolta estonteante
Na alma de estrada,
Desengavetada, em cada brota
Da estação baile de máscaras.
Os rastros, agora,
São arquitetados com alma
De um poético
Compêndio matemático.
Ainda surto flores
No meio da rua
Relevando em conta
Um suposto borboletear
Das calças jeans, ocupadas
Em todos os seus espaços.
Faço o que posso -
Ah, se faço! -
Ainda que tramas de ouro,
No céu de coração
Espete aço.
- Ando de alma no coldre
E, ao mal tempo, saco.
APRENDIZ DE FEITICEIRO
Se eu soubesse lhe ensinar
A ler o Manuel Bandeira
Com o mesmo sem-jeito de quando
Lhe descobria os pudores,
Você teria o lado bom
De minha vontade de chorar
E ficar pequeno.
Aí eu sairia voando
E fazendo caretas às estrelas.
ESTIAGEM
Depois da chuva,
No final de fevereiro
A brisa da tarde
Cochicha-me, nos cabelos,
Que o frio
Irá vir me visitar -
As árvores despem-se
Das folhas
E o céu traz
Um casaco cinza.
PRESTES JOÃO
Minha história terá sangue,
Mas poderia ter tido solE outonos corriqueiros;
Acenos banais em fins de dias -
A volta ao lar -;
A saudável melancolia
De te ver morrer junto a mim:
São meus filhos homens precoces
E tristes.
Minha história terá sangue
Igual a toda aquela que, começando,
Acredita que desiste.
Acredito em meus dedos descarnados
Sabendo trazer,
Aos campos descampados,
O assíduo do olho que assiste
Ao limpo de todo o sangue
Que um dia terá minha história.
sexta-feira, 9 de junho de 2017
INVENÇÃO
Se decapitassem nossas cabeças
Os zepelins chumbados,
No chuvisco outonal,
As praças fariam-se
Fundo de aquário
Tendo a música distante
Dos trovões
E a proximidade
Dos deuses,
O peso humano.
Se abrissem nossas goelas
Os plúmbeos martelos
E deixassem escapar fagulhas,
Os lampiões,
Esperando a nevasca,
Cobririam brumas
E selariam danças fatais.
Um tapete de cascavel,
Na rua principal,
Enrubescido equilíbrio,
Distraído
Em goelas marciais,
Os pés da tempestade.
TORMENTA
Agarre pelo rabo o vendaval
E vá brincando, junto às folhas secas,
Com a primavera, limpando o salão
E, sendo roupa no varal
Ria, se puder, a leveza desse peso.
CARAVELAS
Um menino sem ver o mar
Acredita-o em azul
Degolando borrascas,
Rabiscando em algodão
E espumas.
Talvez teus sonhos
Sejam águas cansadas
E, por pouco que forem,
Céu enxuto,
Dando vazão a pardais
E atormentando canções
Nas grades
Das bocas dos violões.
Um menino sem ver o mar
Em sede,
Nos olhos de chuva.
Um livro de poemas
Esquecido na borda
De uma cratera lunar.
Na areia parda
Uma brisa de menina
E um cão a passear.
Um menino sem ver o mar
Espera caramujos no ouvido,
O ondear fazer sentido,
Ventando praias
E vestidos.
sexta-feira, 2 de junho de 2017
POST SCRIPTUM
Talvez não escreva mais poesia -
Um dia pensei ser o mundo
Uma imensa tigela
Tapada por vidro azul
E cheia de terra! -
Rimbaud desencanou
Aos dezoito
E foi pro meio dos pretos... -
Talvez eu vá plantar batatas -
E seja um vencedor
Dentro de um suposto
Parâmetro conceitual
Machadiano
Que aprendi de ouvido.
Talvez não escreva mais poesia,
Prepotentemente
Supondo que a escrevo.
Não pago a ninguém
O que não devo
E meu peito imponente
Se rasga nos pigarros
Dos relevos.
Talvez tenha olhado demais
Para baixo
E chegou a vez
De embrenhar-me
À sujeira
Da chuva escoada
Nos bueiros -
Talvez escreva, agora,
De chiqueiros.
O ENGAJADO ENGASGADO
Não entendia política
Por opção
E sofria aos que não a entendiam
De coração.
Poeta de rima pobre,
Acabou indo à festa
Numa gravata de cobre.
PROVÍNCIA
Hoje, teu beijo passa longe -
Melodia esquecida -,
E a cidade mal-dormida
Ainda me tange.
Meus compadres?!
Tem gente, por aí,
Teimando sina inglória
Sem saber se irá servir
Triste etiqueta, em livro de história.
Assinar:
Postagens (Atom)