sexta-feira, 26 de maio de 2017

NOVA GARDÊNIA

















Sempre beijo teus olhos
Feito beija-flor - sempre -
E beijo também um mar
Escondido em meio à noite
Que são teus cabelos, ninando azul.
Sempre beijo teus olhos
Que são da tarde a tristeza.
Se de beijo me rouba o sul
Levemente a tempestade,
Desescondo a singeleza
De um teu ar que é de vaidade:

Sempre beijo teus olhos -
Da tarde a beleza
Das tardes da maresia
Sem saber flor azul,
Sempre,
Sempre poesia.

MARIA DE LOURDES

















Maria de Lourdes tinha três filhas -
O orgulho das intempéries
Gravadas em seu magro sorriso,
Mas forte, feito cerne de aroeira.
Maria de Lourdes pegava no batente
Junto ao dia:
Daí arrancava o impossível:
Lingeries;
Calças justas
E blusinhas perfumadas
Enquanto as filhas curtiam
As rebarbas das noturnas promessas -
Eram a sensação no parque de exposição
Das emoções passageiras.
Um conquistador barato
Que sempre se esquecia de anotar
Nomes femininos em canhotos
Mas cultivava ares de colecionador,
Dizia de Maria de Lourdes:
- Fabricante de artigos masculinos
De luxo.
E as filhas desfilavam em círculos
Exalando ao gargarejo
A nobreza das vitrines.
A noite ia alta
Clamando sangue.
Maria de Lourdes tinha por costume
Deitar com as galinhas e,
A esta altura,
Sonhava vestido branco,
Véu e flores.

PLUVIOATIVIDADE















Retilíneo olfato
De telha molhada;
Mansidão desgovernada
Da chuva, rechuvenescendo
No beiral da casa,
Desfechando canção deitada,
Cansada de ter asa.

QUADRA BANDEIRA MAIS UM VERSO PARA MANUEL BANDEIRA















Tinha estrela para a vida inteira
Até, na beira da ribanceira,
Conversar muita besteira
Com um tal Manuel Bandeira,

Então, tive estrelas para brincadeira.

sexta-feira, 19 de maio de 2017

ENFADONHO CANTO

















Segure meus rompantes
De poeta mocinha
E veja o quanto a cidade
É pequena.
Até quando teremos estômagos
Para engolir tanta dor
Em cor amena?

INSÔNIA













Assusto-me em saber
O quanto não tenho
Mais medos.

Com a fé,
A paixão e o ar matinal,
Foram-se embora segredos.

Desapaixonado
Atravesso a porta
Beijando o escuro
Nu de estrelas:

- Dia, ah o dia:
Uma doce mentira da noite!

TARDIA MÚSICA

























Malvado o cerne de tua beleza.
Uma teimosia de aroeira, tosca,
Quando todas as torres da terra,
Tortas, vomitam tijolos grisalhos,
Os fornos, cansados, teimam filhos
Do ventre dos díspares entardares -
Os frangalhos, os cascalhos e o revolto
De tudo aquilo que resolveram chamar estrada
Assentam, displicentemente,
As curvas do teu colo,
Corando semblantes mármore
Nas eternas musas helenas.
De permanente desvario,
Percorro as sombras do bêbado
Enfastiando auroras,
Comendo telhados escarpados,
Sugando todos os chãos,
Sangrando mandíbulas e rascunhos,
Tentando firmar teu bronze
Que voa.

sexta-feira, 12 de maio de 2017

SONETO DE RECAÍDA















Só um sonho. Foi nada. Só um sonho.
Porteiro das fugas desesperadas
Toco ecos, soco as horas quebradas...
Foi nada. Só um silêncio medonho.

Bulia o pó a sombra desvairada
Tosca, rasgando um sufoco enfadonho,
Felando rastros num estupro tristonho,
Quando os risos voavam em bocas caladas.

Foi nada. Só um sonho renitente
Juntando restos, ordenando as frestas,
Calçando em chumbo cada pé dormente

Mas, depois do estupor a alma resta
Reta, dileta, estupefatalmente
Ciente de que tudo acaba em festa.

AMARGO








Vou me pegar em vícios
Amargando contra o lento
Badalar das horas:
Agora
Inutilidades:
Não vou mais te ver
Daqui a dois,
Três dias,
Anos
Passarão eu sei
E eu, certamente
Morrerei.

              O meu amargar
              Já foi e,
              Constantemente
              Virá.

Nada que não seja assim
Tão necessário.

SILVANA



















Teus gestos derramam
A cordialidade
Das damas medievais:
Cara-de-mau,
Faceira,
Séria pirraceira -
Tudo o que era
Já não é mais
E o é rapidamente
Feito, de novo,
A inconsequente primavera:
Todo o ar desatina
Suspirando-te brincando vida
Vestida de menina -
Faz bico,
Pisca sorrateira
E a noite borralheira
Desapercebidamente
Ilumina.

sexta-feira, 5 de maio de 2017

INFINITO



















O branco do céu de garoa
É brando
Assim como meus versos
Fingem tomar tento -
Tudo se trai na promessa de infinito.

BOIA-FRIA
















João Ligeiro era ligeiro
No facão - cortava cana -
E, no balcão era fagueiro -
Bebia cana.

ZARATUSTRA IS ON THE ROAD SIDE

























Zaratustra is on the road side
Talkin' about eternity
Tryin' to break the human misery,
But, everybody's going to hide.

All the things is going back,
All the monkeys
Are waitin' the end,
But,
God is dead!
Don't cry children,
Let's go to the mask,
The tragedy is only beginin'
And always returns.

Dyonisos is laughin'
Just like a madman,
But,
The tear is true
And the happiness is blue.

The snake is long like a ring
And the eagle began to sing
The eternal song of the joker.

PANTHEION

























Vestimos a roupa, na nova estação,
Como mandava o figurino
E falávamos, muito, todas as línguas,
Do Eufrates ao Silício.

Brusco: uma mudez de mármore
Polindo pedra, brilhando vergonha
Aos nossos olhos, no cortejo,
Contemplando a ponta dos sapatos.

Ah, esses gregos, no sonho,
Não tinham pudor em ser flagrados,
Eternamente, fora de moda? -

Pensamos em vestir folhas de vinha.